Se eu te dissesse que existem fermentos que produzem cerveja em sete dias, com um décimo da dose, sem precisar de geladeira, você acreditaria? Pode parecer milagre, mas eles existem! São as Kveik e já estão muito bem consolidadas no Brasil. Que tal conhecermos um pouco melhor?
As cervejas tradicionais europeias
A Europa foi berço das farmhouse ales, receitas de herança Viking feitas de forma muito rústica e mantidas tradicionalmente por famílias camponesas.
De forma particular, a Noruega e países vizinhos realizavam esse processo utilizando água em infusão com galhos de zimbro para a mostura, com longos períodos de duração. As leveduras – Kveik, na língua nativa – eram inoculadas ainda com o mosto quente e o fermentavam em pouquíssimo tempo.
Contando com características geográficas inóspitas, houve pouca introdução de microrganismos na região, então a mesma linhagem foi sendo selecionada e reproduzida, conforme o melhor resultado na cerveja.
Tal processo despertou interesse do pesquisador Lars Marius Garshol, que na década de 2000 intensificou suas pesquisas com produtores da região, não deixando esse material biológico tão importante perecer.
Como funcionam?
Elas são uma linha de Saccharomyces cerevisiae, com perfil similar às comuns. O processo de produção segue o padrão, altera-se apenas a fonte e a quantidade de inóculo, podendo ser utilizado apenas um décimo da dosagem sem causar problemas ao processo.
Quanto à temperatura, pela adaptação às pressões de seleção impostas pelo clima e pelos produtores, esse é um fermento que pode atuar em uma faixa aproximada de 15 °C a 40 °C. Além disso, ele quase não exige período de maturação, o que significa que todo o processo pode ocorrer à temperatura ambiente, excluindo as geladeiras da equação.
Com tantas características positivas, será mesmo que não terão um resultado desagradável? Pelo contrário!
No Brasil, cervejarias e produtores caseiros estão obtendo resultados surpreendentes com esse material, seja por um perfil sensorial que se adequa ao estilo escolhido ou por inovar, fugindo do BJCP. A demanda se tornou tão expressiva que chamou a atenção da maior parte dos laboratórios, os quais já as produzem em larga escala.
Destaco também que mesmo em condições adversas, não é comum elas liberarem muitos off flavours, os aromas e sabores prejudiciais ao seu estilo ou às cervejas em geral. Mesmo com ésteres em grande quantidade, pode ser raro o aroma de solvente, por exemplo.
Bom lembrar que existem muitos tipos de Kveik, capazes de trazer diferentes aromas e sabores, o que torna muito importante comparar suas características com as do estilo escolhido. Para aqueles muito lupulados, pode-se encontrar dificuldade em manter seus aromas, de modo que se recomenda um dry-hopping.
Com tanto a oferecer, confesso que já encomendei as minhas para a próxima brassagem.
Quer saber mais?
O workshop “Kveik com Edson Perrone” é sua oportunidade para se aprofundar no tema, aprender sobre a origem da levedura, produção, como reaproveitar e muito mais! Confira também a live gravada no canal da Bia Bier!
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Edson Perrone é Biólogo formado pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e pós-graduado em Ecologia e Zoologia pela UEM e UFMG. Possui vários trabalhos publicados em revistas especializadas, autor de 15 livros na área de Biologia, Física e Educação. Atualmente, é professor de biologia, cervejeiro artesanal caseiro, Mestre Cervejeiro e consultor da Mythos Cervejas Especiais. É também o proprietário do site http://www.mundokveik.com especializado em KVEIK e do portal HOPZONE sobre jornada cervejeira.
Texto de Vinícius Bertone
Quem é Vinícius Bertone? “Engenheiro Agrônomo, formado na ESALQ – USP. Minha primeira relação com o ramo cervejeiro foi visitando cervejarias artesanais em 2015, onde descobri um novo mundo de possibilidades. Desde então mergulhei cada vez mais, com simpósios, cursos e aprofundei meus conhecimentos com o “Curso Avançado de Fabricação de Cerveja – Sinnatrah Cervejaria Escola”. Sou investidor da cervejaria Leuven e trabalhei na empresa como freelancer. Acompanhei outras produções e fiz a minha primeira sozinho recentemente, uma Weiss. Fui colaborador voluntário do Slow Brew Brasil edição de dezembro de 2019, em São Paulo. E agora, colunista do Site Bia Bier. Sou entusiasta e apaixonado pelo universo cervejeiro!” – completa Vinícius.